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segunda-feira, 22 de março de 2010

TEXTO SOBRE CAZRISMO - NONO ANO

Ivan IV: Senhor terror
Ivan, o Terrível, não ganhou esse nome à toa. O primeiro czar da Rússia reduziu vilarejos a pó e matou até o próprio filho. Historiadores acreditam que ele não era apenas mau: era maluco
por Isabelle Somma
Ivan Vassilievich acreditava que todos conspiravam contra ele. O czar, soberano da Rússia com o nome de Ivan IV, já havia matado membros do governo, amigos, amigos dos amigos e até alguns parentes. Havia eliminado famílias e vilas inteiras, mesmo que as vítimas nada tivessem a ver com o motivo de sua fúria. Ivan só não havia ainda tocado em seus familiares mais próximos. Isso mudou em uma noite do outono de 1581. Muito religioso, o czar repreendeu a nora por usar roupas que ele achou inadequadas. O castigo foi o espancamento. Ela estava grávida. Os golpes dados pelo monarca acabaram provocando o aborto de seu futuro neto.
Indignado, Ivan Ivanovich, herdeiro do trono, resolveu enfrentar o pai em defesa da esposa. A fúria do czar então se voltou contra o filho: com sua bengala de ferro, Ivan o golpeou na cabeça. Onze dias depois, o ferimento levaria Ivan Ivanovich à morte. Por causa de uma discussão, o monarca tinha exterminado seus herdeiros diretos. Não foi à toa que ele passou à história como Ivan, o Terrível. Apesar de ter centralizado o poder e conquistado importantes territórios, o primeiro czar da Rússia acabou eternizado por sua violência. Mas, recentemente, pesquisadores têm visto no monarca mais do que simples maldade. Ele teria sofrido graves desequilíbrios mentais.
Ivan nasceu em 25 de agosto de 1530, nos arredores de Moscou. A cidade, que não parava de crescer, era a capital do Grande Reino de Moscóvia, governado pelo pai de Ivan, Vassili III. O território era cercado por povos tártaros, que viviam em Estados conhecidos como “khanatos” (comandados por líderes chamados “khans”). Não eram raras as guerras dos moscovitas contra os vizinhos.
Quando Vassili III caiu doente e morreu, em 1533, o pequeno Ivan foi proclamado grande príncipe, o líder do Reino de Moscóvia. Como ele era muito jovem, Elena Glinskaya, sua mãe, assumiu o trono. Em 1538, ela também morreu, provavelmente envenenada. Na ausência de Elena, explodiram as disputas internas pelo poder no reino. Os protagonistas da briga eram os boiardos, nobres proprietários de terras que faziam parte do governo e que, de vez em quando, entravam em guerra uns contra os outros.
Órfão aos 8 anos, Ivan passou a ser criado sob a supervisão dos boiardos. O fato de ser príncipe não lhe garantiu uma infância privilegiada: o garoto foi tratado de forma brutal e chegou a passar fome. Não é de se estranhar que, com um exemplo péssimo desses, Ivan tenha aprendido a lidar com os outros da mesma maneira. Começou jogando gatos e cachorros pelas janelas do palácio em que morava, dentro dos muros do Kremlin (a fortaleza que até hoje abriga o governo russo). Passou então a maltratar servos e, mais tarde, a matá-los por pura diversão. Era um ensaio para os grandes massacres que iria promover.
A péssima criação de Ivan, entretanto, não basta para explicar seu comportamento na época adulta. “Quando jovem, ele provavelmente viu algumas cenas cruéis da luta entre várias facções da corte. Esses conflitos eram típicos em qualquer corte do século 16”, afirma o russo Sergei Bogatyrev, professor de História Russa Antiga do University College de Londres, Inglaterra. Ora, se a crueldade era comum em outros reinos, por que somente Ivan foi tão sanguinário? O americano Richard Hellie, professor de História Russa da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, afirma que o czar era mesmo doente da cabeça. “Muito do comportamento de Ivan pode ser justificado por teorias modernas que explicam tipos comuns de paranóia, como mania de perseguição e megalomania.”
De herói a vilão
Aos 16 anos, em janeiro de 1547, Ivan se tornou o primeiro a ser coroado czar, o “grande príncipe de toda a Rússia”. Monarcas anteriores já haviam recebido o título (derivado dos “césares” de Roma), mas nenhum deles havia sido abençoado e reconhecido pela poderosa Igreja Ortodoxa. Acredita-se que os distúrbios mentais de Ivan tenham começado justamente após sua coroação: a cerimônia fez com que ele acreditasse ser mesmo um líder enviado dos céus.
Mas, antes de mergulhar a Rússia em um inferno, Ivan até que melhorou a vida de seus súditos. Nos primeiros anos de reinado, ele centralizou o poder em Moscou e derrubou o velho esquema medieval, em que cada nobre era soberano no seu pedaço de terra. O ódio que Ivan tinha dos boiardos fez com que ele se livrasse de boa parte deles, dando altos cargos públicos a pessoas comuns. Representantes populares ganharam espaço no Zemsky Sobor, a “assembléia da nação” instituída pelo czar, que reunia também membros da nobreza e do clero.
Enquanto colocava ordem na casa, Ivan ia botando as manguinhas de fora e expandindo seus domínios. Conquistou grandes territórios dos inimigos tártaros a leste e ao sul, chegando até o mar Cáspio e mais tarde atingindo a gélida Sibéria. A expansão das fronteiras trouxe tranqüilidade ao povo da Rússia, já que os tártaros, durante suas invasões, costumavam capturar russos e vendê-los como escravos.
Para comemorar a derrota dos tártaros, que eram muçulmanos, Ivan mandou construir um enorme templo ortodoxo em Moscou. Após o fim dos seis anos de obras, iniciadas em 1555, o czar ficou extremamente impressionado com o resultado (a bela e colorida catedral de São Basílico é até hoje um dos maiores símbolos da Rússia). Diz a lenda que, em vez de premiar os responsáveis pela construção, Ivan teria mandado cegá-los, para garantir que eles não construíssem nada mais belo que aquela igreja.
O lado assassino de Ivan teria sido despertado, segundo historiadores, por causa da morte da esposa, a czarina Anastácia, em 1560. A fatalidade pôs fim a 13 anos de casamento. “A morte dela foi quase imediatamente seguida de um ato irracional. Ivan culpou seus conselheiros pelo fato e ordenou a realização de um julgamento religioso para declará-los bruxos”, relata o professor Richard Hellie. Até Aleksey Adashev, seu auxiliar mais próximo, não escapou da ira do czar: foi preso e cometeu suicídio na prisão.
Depois de Anastácia, Ivan tentou, em vão, se firmar com outra mulher. Casou-se mais sete vezes – algumas dessas uniões terminaram em poucas semanas. Em vez de se preocupar com a felicidade conjugal, o czar voltou sua atenção à perseguição de supostos traidores da pátria. Essa paranóia fez com que, em 1565, Ivan formasse a Oprichnina (termo que, em russo antigo, significa algo como “Estado separado”). Com a medida, um terço de todo o território do Reino da Moscóvia ficou apenas sob seu governo, sem a interferência dos boiardos ou da assembléia de representantes que ele mesmo criara.
Ivan se apropriou das melhores terras e nelas implantou um regime de terror, colocado em prática por sua guarda pessoal. “Um dos mais cruéis atos durante a Oprichnina foi uma expedição punitiva contra a cidade de Novgorod, em 1570, em que foram mortas entre 3 mil e 15 mil pessoas”, diz o professor Sergei Bogatyrev. Todas essas mortes ocorreram porque as tropas de Ivan, que tinham autonomia para matar qualquer um, estavam perseguindo apenas dois administradores locais acusados de traição.
Ao mesmo tempo em que perseguia sem dó o povo russo, Ivan mandava, secretamente, que religiosos rezassem pelas vítimas dos massacres – afinal, ele era um homem de fé. Séculos mais tarde, uma lista da época foi encontrada, com nada menos que 4095 nomes de defuntos que mereceram orações encomendadas pelo czar. Segundo o professor Richard Hellie, a lista indica que os assassinatos durante a vigência da Oprichnina, que durou até 1572, podem não ter ultrapassado esse número.
Xeque-morte
Enquanto dentro da Rússia o desequilíbrio mental de Ivan causava morte e destruição, no exterior suas tropas levavam surras homéricas. Desde 1558, elas estavam metidas em uma guerra para conquistar a Livônia (que hoje corresponde a grande parte da Letônia e da Estônia). Lá, poloneses e suecos mostraram ser inimigos bem piores que os tártaros.
O czar não era um general brilhante nem ia muito ao campo de batalha. A guerra durou 25 anos e, ao final, nenhum pedaço de terra foi ganho. Do lado russo, as baixas mais importantes não foram feitas pelos inimigos, mas por Ivan. “Alguns bons diplomatas e comandantes militares se tornaram vítimas da Oprichnina”, diz o professor Sergei Bogatyrev.
Em 1581, quando a derrota na Livônia estava próxima, ocorreu o incidente que selou o destino do czar: a morte do filho – e do neto, ainda na barriga da mãe. “O assassinato acidental de Ivan Ivanovich foi a maior tragédia da vida de Ivan, o Terrível”, afirma Bogatyrev. Meses após o ocorrido, o monarca teve um colapso físico: sua barba embranqueceu e ele perdeu os cabelos e o vigor.
Enquanto a vida do monarca ia mal, a dos russos ia pior ainda. Vilas inteiras haviam sido eliminadas durante seu regime. Muitos trabalhadores abandonaram os campos e a produção agrícola entrou em declínio. Os nobres e o clero, antes muito influentes, se recolhiam, temendo os ataques de loucura do czar. O medo e a pobreza dominavam o reino do homem que, naquela época, já era chamado de Ivan Grozny (a tradução da alcunha em russo para o português é “o horrendo”, mas a versão vinda do inglês terrible acabou ficando mais popular).
A hora de Ivan chegou em 18 de março de 1584. Morreu enquanto jogava xadrez, provavelmente vítima de um ataque cardíaco. Surgiram suspeitas de que o czar, como a mãe, tivesse sido envenenado. Depois de exumar seu cadáver, em 1968, pesquisadores descobriram que os restos mortais tinham traços de cianureto, o que continuou dando força a essa tese. Mas é bom lembrar que a substância, altamente tóxica, era utilizada na época para o tratamento da sífilis, doença que Ivan havia contraído.
Um dos acusados de ter envenenado o czar foi Boris Godunov, seu auxiliar. Ele era tio de Fiódor, que assumiu o trono por ser filho do último casamento de Ivan. Na prática, era Godunov quem governava, pois o novo czar não se interessava pelo cargo. Assim como o pai, Fiódor era meio esquisito. Mas, em vez de matar pessoas, sua paixão era tocar sinos. Foi o que ele mais fez até morrer, em 1598. Como não havia outros herdeiros, Godunov acabou virando czar.

Moscou em chamas
A tirania de Ivan deixou a capital à mercê dos tártaros
Os moscovitas sofreram muito durante o governo de Ivan, o Terrível. Com medo de suas reações sanguinárias e explosivas, um monte de gente preferiu abandonar a cidade em vez de viver sob as barbas do tirano. O êxodo fez com que a mão-de-obra começasse a escassear nos arredores da capital. Faltava comida, faltavam soldados para defender o local. Em 1571, aproveitando o fato de que o exército russo estava ocupado levando uma surra na guerra da Livônia, o khan Devlet I, líder tártaro da Criméia, resolveu atacar a desguarnecida Moscou. Como as vitórias militares de anos anteriores tinham mantido os tártaros distantes, a cidade acabou sendo pega de surpresa. Vindas do sul, as forças de Devlet I incendiaram Moscou. Segundo relatos da época, a cidade foi completamente destruída e mais de 10 mil pessoas morreram nas chamas. Os tártaros voltaram no ano seguinte. Mas, dessa vez, encontraram forte resistência. Ivan tinha convocado o príncipe Mikhail Vorotinsky para organizar a defesa. O nobre impôs uma dura derrota a Devlet I, que perdeu o filho e o neto durante a batalha por Moscou. A grande vitória de Vorotinsky fez com que a população o saudasse como herói. Depois de ouvir boatos dizendo que o príncipe pretendia usar feitiçaria para tomar seu lugar, o czar decidiu aprisioná-lo. Ivan seguiu então o exemplo dos tártaros em Moscou: usou fogo para torturar o príncipe, que acabou morrendo por causa das queimaduras. Para completar, o czar fez questão de sumir com todos os documentos sobre o heroísmo de Vorotinsky.
O czar dos czares
Pedro, o Grande, levou adiante as conquistas (e a violência) de Ivan
Ele tinha mais de 2 metros de altura. Mas não foi só por causa disso que o czar Pedro I ficou conhecido como o Grande. Ele foi um dos maiores estadistas da Rússia. Nascido em 1672, governou sozinho a partir de 1696 (antes, dividira o poder com seu irmão) e ficou no trono até 1725, quando morreu. Além de modernizar o país e transformá-lo numa das maiores potências do século 18, Pedro conquistou o território que tinha sido a pedra no sapato de Ivan, o Terrível. Foi em 1714, quando as tropas de Pedro enfim derrotaram poloneses e suecos e ocuparam a Livônia. E não foi só isso. O czar investiu grandes quantias na criação de uma frota de barcos de guerra que permitiu invadir outro território sob domínio dos suecos: a Finlândia. As vitórias no oeste foram fundamentais para Pedro, que sempre teve suas atenções voltadas para o lado ocidental da Rússia. Perto do mar Báltico, ele resolveu construir uma nova capital, São Petersburgo (em homenagem a São Pedro, o apóstolo). Quando decidia os rumos de seu império, o czar tinha como modelo as grandes nações da Europa. Em uma viagem realizada em 1697 por países como Holanda, França e Inglaterra, Pedro se apaixonou pelas culturas locais. Ao voltar, exigiu que todos os nobres cortassem suas longas barbas, para ficar mais parecidos com os membros das cortes européias – aqueles que se recusavam a fazê-lo tinham de pagar impostos extras. Mas o sofisticado Pedro também tinha seu lado terrível. Em 1698, uma unidade do Exército se amotinou enquanto ele estava, de novo, viajando pela Europa. Quando o czar voltou para casa, a rebelião já havia sido contida. Pedro não perdeu a oportunidade de se vingar: cerca de 1200 participantes do motim foram torturados e mortos – e o próprio czar se encarregou de alguns deles. Outra vítima de Pedro, exemplo de Ivan, foi o próprio filho. A diferença é que, no caso de Pedro, foi tudo de propósito. Em 1718, o czar mandou que o filho fosse torturado até a morte por não ter seguido uma ordem sua.
AVENTURAS NA HISTÓRIA – EDIÇÃO 076

TEXTO SOBRE CZARISMO - NONO ANO

Ivan IV: Senhor terror
Ivan, o Terrível, não ganhou esse nome à toa. O primeiro czar da Rússia reduziu vilarejos a pó e matou até o próprio filho. Historiadores acreditam que ele não era apenas mau: era maluco
por Isabelle Somma
Ivan Vassilievich acreditava que todos conspiravam contra ele. O czar, soberano da Rússia com o nome de Ivan IV, já havia matado membros do governo, amigos, amigos dos amigos e até alguns parentes. Havia eliminado famílias e vilas inteiras, mesmo que as vítimas nada tivessem a ver com o motivo de sua fúria. Ivan só não havia ainda tocado em seus familiares mais próximos. Isso mudou em uma noite do outono de 1581. Muito religioso, o czar repreendeu a nora por usar roupas que ele achou inadequadas. O castigo foi o espancamento. Ela estava grávida. Os golpes dados pelo monarca acabaram provocando o aborto de seu futuro neto.
Indignado, Ivan Ivanovich, herdeiro do trono, resolveu enfrentar o pai em defesa da esposa. A fúria do czar então se voltou contra o filho: com sua bengala de ferro, Ivan o golpeou na cabeça. Onze dias depois, o ferimento levaria Ivan Ivanovich à morte. Por causa de uma discussão, o monarca tinha exterminado seus herdeiros diretos. Não foi à toa que ele passou à história como Ivan, o Terrível. Apesar de ter centralizado o poder e conquistado importantes territórios, o primeiro czar da Rússia acabou eternizado por sua violência. Mas, recentemente, pesquisadores têm visto no monarca mais do que simples maldade. Ele teria sofrido graves desequilíbrios mentais.
Ivan nasceu em 25 de agosto de 1530, nos arredores de Moscou. A cidade, que não parava de crescer, era a capital do Grande Reino de Moscóvia, governado pelo pai de Ivan, Vassili III. O território era cercado por povos tártaros, que viviam em Estados conhecidos como “khanatos” (comandados por líderes chamados “khans”). Não eram raras as guerras dos moscovitas contra os vizinhos.
Quando Vassili III caiu doente e morreu, em 1533, o pequeno Ivan foi proclamado grande príncipe, o líder do Reino de Moscóvia. Como ele era muito jovem, Elena Glinskaya, sua mãe, assumiu o trono. Em 1538, ela também morreu, provavelmente envenenada. Na ausência de Elena, explodiram as disputas internas pelo poder no reino. Os protagonistas da briga eram os boiardos, nobres proprietários de terras que faziam parte do governo e que, de vez em quando, entravam em guerra uns contra os outros.
Órfão aos 8 anos, Ivan passou a ser criado sob a supervisão dos boiardos. O fato de ser príncipe não lhe garantiu uma infância privilegiada: o garoto foi tratado de forma brutal e chegou a passar fome. Não é de se estranhar que, com um exemplo péssimo desses, Ivan tenha aprendido a lidar com os outros da mesma maneira. Começou jogando gatos e cachorros pelas janelas do palácio em que morava, dentro dos muros do Kremlin (a fortaleza que até hoje abriga o governo russo). Passou então a maltratar servos e, mais tarde, a matá-los por pura diversão. Era um ensaio para os grandes massacres que iria promover.
A péssima criação de Ivan, entretanto, não basta para explicar seu comportamento na época adulta. “Quando jovem, ele provavelmente viu algumas cenas cruéis da luta entre várias facções da corte. Esses conflitos eram típicos em qualquer corte do século 16”, afirma o russo Sergei Bogatyrev, professor de História Russa Antiga do University College de Londres, Inglaterra. Ora, se a crueldade era comum em outros reinos, por que somente Ivan foi tão sanguinário? O americano Richard Hellie, professor de História Russa da Universidade de Chicago, nos Estados Unidos, afirma que o czar era mesmo doente da cabeça. “Muito do comportamento de Ivan pode ser justificado por teorias modernas que explicam tipos comuns de paranóia, como mania de perseguição e megalomania.”
De herói a vilão
Aos 16 anos, em janeiro de 1547, Ivan se tornou o primeiro a ser coroado czar, o “grande príncipe de toda a Rússia”. Monarcas anteriores já haviam recebido o título (derivado dos “césares” de Roma), mas nenhum deles havia sido abençoado e reconhecido pela poderosa Igreja Ortodoxa. Acredita-se que os distúrbios mentais de Ivan tenham começado justamente após sua coroação: a cerimônia fez com que ele acreditasse ser mesmo um líder enviado dos céus.
Mas, antes de mergulhar a Rússia em um inferno, Ivan até que melhorou a vida de seus súditos. Nos primeiros anos de reinado, ele centralizou o poder em Moscou e derrubou o velho esquema medieval, em que cada nobre era soberano no seu pedaço de terra. O ódio que Ivan tinha dos boiardos fez com que ele se livrasse de boa parte deles, dando altos cargos públicos a pessoas comuns. Representantes populares ganharam espaço no Zemsky Sobor, a “assembléia da nação” instituída pelo czar, que reunia também membros da nobreza e do clero.
Enquanto colocava ordem na casa, Ivan ia botando as manguinhas de fora e expandindo seus domínios. Conquistou grandes territórios dos inimigos tártaros a leste e ao sul, chegando até o mar Cáspio e mais tarde atingindo a gélida Sibéria. A expansão das fronteiras trouxe tranqüilidade ao povo da Rússia, já que os tártaros, durante suas invasões, costumavam capturar russos e vendê-los como escravos.
Para comemorar a derrota dos tártaros, que eram muçulmanos, Ivan mandou construir um enorme templo ortodoxo em Moscou. Após o fim dos seis anos de obras, iniciadas em 1555, o czar ficou extremamente impressionado com o resultado (a bela e colorida catedral de São Basílico é até hoje um dos maiores símbolos da Rússia). Diz a lenda que, em vez de premiar os responsáveis pela construção, Ivan teria mandado cegá-los, para garantir que eles não construíssem nada mais belo que aquela igreja.
O lado assassino de Ivan teria sido despertado, segundo historiadores, por causa da morte da esposa, a czarina Anastácia, em 1560. A fatalidade pôs fim a 13 anos de casamento. “A morte dela foi quase imediatamente seguida de um ato irracional. Ivan culpou seus conselheiros pelo fato e ordenou a realização de um julgamento religioso para declará-los bruxos”, relata o professor Richard Hellie. Até Aleksey Adashev, seu auxiliar mais próximo, não escapou da ira do czar: foi preso e cometeu suicídio na prisão.
Depois de Anastácia, Ivan tentou, em vão, se firmar com outra mulher. Casou-se mais sete vezes – algumas dessas uniões terminaram em poucas semanas. Em vez de se preocupar com a felicidade conjugal, o czar voltou sua atenção à perseguição de supostos traidores da pátria. Essa paranóia fez com que, em 1565, Ivan formasse a Oprichnina (termo que, em russo antigo, significa algo como “Estado separado”). Com a medida, um terço de todo o território do Reino da Moscóvia ficou apenas sob seu governo, sem a interferência dos boiardos ou da assembléia de representantes que ele mesmo criara.
Ivan se apropriou das melhores terras e nelas implantou um regime de terror, colocado em prática por sua guarda pessoal. “Um dos mais cruéis atos durante a Oprichnina foi uma expedição punitiva contra a cidade de Novgorod, em 1570, em que foram mortas entre 3 mil e 15 mil pessoas”, diz o professor Sergei Bogatyrev. Todas essas mortes ocorreram porque as tropas de Ivan, que tinham autonomia para matar qualquer um, estavam perseguindo apenas dois administradores locais acusados de traição.
Ao mesmo tempo em que perseguia sem dó o povo russo, Ivan mandava, secretamente, que religiosos rezassem pelas vítimas dos massacres – afinal, ele era um homem de fé. Séculos mais tarde, uma lista da época foi encontrada, com nada menos que 4095 nomes de defuntos que mereceram orações encomendadas pelo czar. Segundo o professor Richard Hellie, a lista indica que os assassinatos durante a vigência da Oprichnina, que durou até 1572, podem não ter ultrapassado esse número.
Xeque-morte
Enquanto dentro da Rússia o desequilíbrio mental de Ivan causava morte e destruição, no exterior suas tropas levavam surras homéricas. Desde 1558, elas estavam metidas em uma guerra para conquistar a Livônia (que hoje corresponde a grande parte da Letônia e da Estônia). Lá, poloneses e suecos mostraram ser inimigos bem piores que os tártaros.
O czar não era um general brilhante nem ia muito ao campo de batalha. A guerra durou 25 anos e, ao final, nenhum pedaço de terra foi ganho. Do lado russo, as baixas mais importantes não foram feitas pelos inimigos, mas por Ivan. “Alguns bons diplomatas e comandantes militares se tornaram vítimas da Oprichnina”, diz o professor Sergei Bogatyrev.
Em 1581, quando a derrota na Livônia estava próxima, ocorreu o incidente que selou o destino do czar: a morte do filho – e do neto, ainda na barriga da mãe. “O assassinato acidental de Ivan Ivanovich foi a maior tragédia da vida de Ivan, o Terrível”, afirma Bogatyrev. Meses após o ocorrido, o monarca teve um colapso físico: sua barba embranqueceu e ele perdeu os cabelos e o vigor.
Enquanto a vida do monarca ia mal, a dos russos ia pior ainda. Vilas inteiras haviam sido eliminadas durante seu regime. Muitos trabalhadores abandonaram os campos e a produção agrícola entrou em declínio. Os nobres e o clero, antes muito influentes, se recolhiam, temendo os ataques de loucura do czar. O medo e a pobreza dominavam o reino do homem que, naquela época, já era chamado de Ivan Grozny (a tradução da alcunha em russo para o português é “o horrendo”, mas a versão vinda do inglês terrible acabou ficando mais popular).
A hora de Ivan chegou em 18 de março de 1584. Morreu enquanto jogava xadrez, provavelmente vítima de um ataque cardíaco. Surgiram suspeitas de que o czar, como a mãe, tivesse sido envenenado. Depois de exumar seu cadáver, em 1968, pesquisadores descobriram que os restos mortais tinham traços de cianureto, o que continuou dando força a essa tese. Mas é bom lembrar que a substância, altamente tóxica, era utilizada na época para o tratamento da sífilis, doença que Ivan havia contraído.
Um dos acusados de ter envenenado o czar foi Boris Godunov, seu auxiliar. Ele era tio de Fiódor, que assumiu o trono por ser filho do último casamento de Ivan. Na prática, era Godunov quem governava, pois o novo czar não se interessava pelo cargo. Assim como o pai, Fiódor era meio esquisito. Mas, em vez de matar pessoas, sua paixão era tocar sinos. Foi o que ele mais fez até morrer, em 1598. Como não havia outros herdeiros, Godunov acabou virando czar.

Moscou em chamas
A tirania de Ivan deixou a capital à mercê dos tártaros
Os moscovitas sofreram muito durante o governo de Ivan, o Terrível. Com medo de suas reações sanguinárias e explosivas, um monte de gente preferiu abandonar a cidade em vez de viver sob as barbas do tirano. O êxodo fez com que a mão-de-obra começasse a escassear nos arredores da capital. Faltava comida, faltavam soldados para defender o local. Em 1571, aproveitando o fato de que o exército russo estava ocupado levando uma surra na guerra da Livônia, o khan Devlet I, líder tártaro da Criméia, resolveu atacar a desguarnecida Moscou. Como as vitórias militares de anos anteriores tinham mantido os tártaros distantes, a cidade acabou sendo pega de surpresa. Vindas do sul, as forças de Devlet I incendiaram Moscou. Segundo relatos da época, a cidade foi completamente destruída e mais de 10 mil pessoas morreram nas chamas. Os tártaros voltaram no ano seguinte. Mas, dessa vez, encontraram forte resistência. Ivan tinha convocado o príncipe Mikhail Vorotinsky para organizar a defesa. O nobre impôs uma dura derrota a Devlet I, que perdeu o filho e o neto durante a batalha por Moscou. A grande vitória de Vorotinsky fez com que a população o saudasse como herói. Depois de ouvir boatos dizendo que o príncipe pretendia usar feitiçaria para tomar seu lugar, o czar decidiu aprisioná-lo. Ivan seguiu então o exemplo dos tártaros em Moscou: usou fogo para torturar o príncipe, que acabou morrendo por causa das queimaduras. Para completar, o czar fez questão de sumir com todos os documentos sobre o heroísmo de Vorotinsky.
O czar dos czares
Pedro, o Grande, levou adiante as conquistas (e a violência) de Ivan
Ele tinha mais de 2 metros de altura. Mas não foi só por causa disso que o czar Pedro I ficou conhecido como o Grande. Ele foi um dos maiores estadistas da Rússia. Nascido em 1672, governou sozinho a partir de 1696 (antes, dividira o poder com seu irmão) e ficou no trono até 1725, quando morreu. Além de modernizar o país e transformá-lo numa das maiores potências do século 18, Pedro conquistou o território que tinha sido a pedra no sapato de Ivan, o Terrível. Foi em 1714, quando as tropas de Pedro enfim derrotaram poloneses e suecos e ocuparam a Livônia. E não foi só isso. O czar investiu grandes quantias na criação de uma frota de barcos de guerra que permitiu invadir outro território sob domínio dos suecos: a Finlândia. As vitórias no oeste foram fundamentais para Pedro, que sempre teve suas atenções voltadas para o lado ocidental da Rússia. Perto do mar Báltico, ele resolveu construir uma nova capital, São Petersburgo (em homenagem a São Pedro, o apóstolo). Quando decidia os rumos de seu império, o czar tinha como modelo as grandes nações da Europa. Em uma viagem realizada em 1697 por países como Holanda, França e Inglaterra, Pedro se apaixonou pelas culturas locais. Ao voltar, exigiu que todos os nobres cortassem suas longas barbas, para ficar mais parecidos com os membros das cortes européias – aqueles que se recusavam a fazê-lo tinham de pagar impostos extras. Mas o sofisticado Pedro também tinha seu lado terrível. Em 1698, uma unidade do Exército se amotinou enquanto ele estava, de novo, viajando pela Europa. Quando o czar voltou para casa, a rebelião já havia sido contida. Pedro não perdeu a oportunidade de se vingar: cerca de 1200 participantes do motim foram torturados e mortos – e o próprio czar se encarregou de alguns deles. Outra vítima de Pedro, exemplo de Ivan, foi o próprio filho. A diferença é que, no caso de Pedro, foi tudo de propósito. Em 1718, o czar mandou que o filho fosse torturado até a morte por não ter seguido uma ordem sua.
AVENTURAS NA HISTÓRIA – EDIÇÃO 076